Anais do III Seminário Crítica do Direito e Subjetividade Jurídica

IDEOLOGIA E PÓS-FORDISMO

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APRESENTAÇÃO


Prof. Dr. Alysson Leandro Barbate Mascaro (FD-USP)

No ano de 2022, na tradicional Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, o Largo São Francisco, deu-se o III Seminário Crítica do Direito e Subjetividade Jurídica. O evento ocorreu nos dias 10, 11 e 12 de dezembro, mediante plataformas de internet, contando com o apoio da Boitempo Editorial, tendo sido transmitido no Youtube pelo Canal do Grupo de Pesquisa Crítica do Direito e Subjetividade Jurídica, bem como pelo Canal da TV Boitempo.

O tema do III Seminário do Crítica do Direito e Subjetividade Jurídica foi “Ideologia e Pós-Fordismo”, refletindo as atividades desenvolvidas no ano de 2021 pelo Grupo de Pesquisa. O Seminário arrematou uma sequência de leituras, estudos, pesquisas, debates, encontros e eventos em torno de tais temas.

Além de importantes intelectuais do exterior, como Beatriz Rajland e Carlos Rivera-Lugo, reuni, neste III Seminário, expressivos palestrantes e debatedores brasileiros, muitos deles antigos e atuais orientandos meus, e todos engajados nas melhores lutas teóricas e sociais. A equipe de meus orientandos e pesquisadores, tendo à frente minha orientanda de doutorado Thais Hoshika, foi responsável por engendrar e coordenar uma gama de atividades para que o evento lograsse êxito. O III Seminário contou com numeroso acompanhamento ao vivo e, posteriormente, também grande número de acessos aos vídeos disponibilizados. Trata-se de uma projeção decisiva da pesquisa e da reflexão produzida pela Universidade.

As sessões de comunicação oral do III Seminário Internacional tiveram dois eixos temáticos: “Ideologia e capitalismo contemporâneo”; “Pós-fordismo e luta de classes”. Deu-se a submissão e apresentação de vários resumos expandidos. O Seminário Internacional de 2022 espelhou a grande procura e a participação no processo seletivo do Grupo de Pesquisa, cujos resultados têm servido de pauta a muitas discussões e publicações de variados grupos e pesquisadores.

Proponho ler o capitalismo como sendo o determinante do arcabouço ideológico das subjetividades e, aqui, o sujeito de direito é o elemento chave dessa constituição inconsciente das relações sociais dos portadores de mercadoria, tanto quanto o cidadão é o seu par no que tange às suas dimensões políticas. No fundamental, é a materialidade da exploração do trabalho mediante forma assalariada que erige a ideologia do portador de direitos, que circula também sua vontade política e institucional estatal. Daí que, desde as revoluções burguesas do final do século XVIII até o século XXI, os horizontes de luta são via de regra enredados sob o mesmo pano de fundo ideológico: defesa da liberdade negocial, da autonomia da vontade, da igualdade perante a lei. O liberalismo, embalado em variados rótulos contingenciais, é o corolário daquilo que se pode chamar, com maiúscula, Ideologia. Propriedade privada, liberdade e igualdade são seus núcleos basilares, compulsórios e invariáveis.

Ocorre que os tempos históricos do capitalismo se dão em formações históricas variáveis, tanto no tempo quanto no espaço. Sociedades originalmente muito diferentes entre si são sempre tragadas, embora mediante imposições diversas, pela força da mercadoria: se a Europa sai do feudalismo ao capitalismo, em muitos espaços do continente americano estabelece-se uma transição de modos de produção a partir do escravo colonial. Patriarcalismos, racismos, sexismos, xenofobias e variadas dominações e opressões se reconfiguram e se configuram com o capitalismo. De tal modo, a Ideologia do modo de produção capitalista se apresenta, necessariamente, também como ideologias, no plural, variadas, não necessariamente coerentes entre si, mas coesas na reprodução do capital e da Ideologia.

A dinâmica dos tempos históricos forja também especificidades nos regimes de acumulação e nos modos de regulação do capitalismo. Trata-se, aqui, de identificar termos médios do modo de produção. Desde o final do século XX, o regime de acumulação pós-fordista impõe interpelações ideológicas próprias como corolário de sua estratégia de valorização do valor e de sua regulação. Do afastamento dos direitos sociais ao empreendedorismo, uma série de ideologias específicas se estabelece nas décadas presentes, distinta de velhos organicismos do fordismo. A Ideologia, do sujeito de direito proprietário e circulador livre de mercadorias, consubstancia-se nas ideologias do sujeito empresário de si mesmo, acentuadamente narcisista e refletido pela sua representação imagética em redes sociais virtuais.

A ideologia do pós-fordismo não é uma terceira em face da Ideologia do capital: é uma de suas manifestações possíveis e, mesmo, uma de suas faces mais cruéis e realistas, a tomar a inspiração do conceito de realismo capitalista proposta, dentre outros, por Mark Fisher. Trata-se de compreender a Ideologia se manifestando sem as máscaras ou as maquiagens do velho nacionalismo ou do bem-estar social. Resta apenas o embalo do plano ideológico inexorável: o sujeito como mero indivíduo, a propriedade como nucleação determinante, a mercadoria como forma relacional geral, a acumulação como lei orientadora da dinâmica social, a repressão, o Estado e o direito como ordenadores dos não-possuidores.

O propósito da reflexão teórica mais alta e mais avançada não é o de retomar frágeis liames de contenção das formas sociais do capital e de sua Ideologia. Não se opõem ideologias à Ideologia. No fundamental, a crítica deve alcançar a determinação social. São as formas de relação social o problema. É toda a Ideologia o problema. Assim, não a contenção nem a reforma nem a piedade nem o apelo ao humanismo, mas o totalmente Outro das formas de relação social. Ideologia contra Ideologia. O capitalismo como problema, o socialismo como solução.

Estas páginas dos Anais deste Seminário são contributos da ciência para a esperança da luta transformadora.  


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GRUPO DE PESQUISA
CRÍTICA DO DIREITO E SUBJETIVIDADE JURÍDICA


Coordenação
Alysson Leandro Barbate Mascaro

Comissão Científica
Camila Alves Hessel Reimberg
Camilo Onoda Caldas
Hector Cury Soares
Juliana Paula Magalhães
Lucas Balconi
Luiz Felipe Brandão Osório
Luiz Ismael Pereira
Patrick Mariano
Pedro Eduardo Zini Davoglio
Taylisi de Souza Correa Leite
Victor Vicente Barau 

Comissão Organizadora

Felipe de Mello Souza
Guilherme Baggio Costa
Gustavo Carneiro da Silva
Igor Lopes
Jorge Fernando Reis de Oliveira Freitas
Leonardo Godoy Drigo
Lucas Fogaça
Matheus Muniz Weiss
Pedro Leal Pessoa Mendes
Romulo Cassi Soares de Melo
Reginaldo Gomes da Silva Filho
Thais Hoshika
Thiago Jorge Kühl
Victor Garcia Ferreira

Comissão Avaliadora

Antonio Augusto Galvão de França
Cláudio Rennó Villela
Daniel Soares Mayor Fabre
João Luiz Moura
Leonardo Godoy Drigo
Luiz Octávio Sibahi
Lucas Fogaça
Marcelo Azevedo Chamone
Matheus Belló Moraes
Pedro Leal Pessoa Mendes
Suzana Maria Loureiro Silveira
Thais Hoshika
Thiago Jorge Kühl 

Organização dos anais
Amanda Franco Grillo Zakir
Beatriz Araújo da Silva
Felipe de Mello Souza
Matheus Muniz Weiss
Reginaldo Gomes da Silva Filho
Suzana Maria Loureiro Silveira
Thais Hoshika

Normatização e revisão

Os autores